Análises genéticas a chimpanzés revelam origem da malária em humanos


O parasita responsável pela grande maioria dos casos de malária e por praticamente todas as mortes relacionadas com esta doença em humanos foi transmitido por chimpanzés da África equatorial, argumenta uma equipa de cientistas dos EUA.
A descoberta, descrita num artigo publicado na revista da Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), pode ser importante no desenvolvimento de uma vacina e ajudar a compreender outras doenças infecciosas transmitidas ao homem pelos animais, como a Sida ou os vários tipos de gripe.
O trabalho, que decorreu nos santuários dos Camarões e da Costa do Marfim, conseguiu provar que, ao contrário do que se pensava, os dois parasitas não existiram separadamente ao longo do tempo. Mais do que provar que este perigoso parasita foi transmitido aos humanos pelos chimpanzés, os investigadores defendem que para esta “viagem” terá sido suficiente um único mosquito. “Uma importante conclusão da nossa investigação é que as principais doenças humanas foram adquiridas por transferência de parasitas de chimpanzés e outros animais”, sublinha Francisco Ayala, investigador da Universidade da Califórnia e um dos autores principais do estudo num email enviado ao PÚBLICO, acrescentando que a Sida ou a gripe são provocadas por virus (muito mais pequeno que um parasita) e não usam um intermediário como o mosquito para a infecção.
Os cientistas analisaram amostras de variantes do parasita encontrado no sangue recolhido em exames de rotina feitos a 94 chimpanzés. A pesquisa genética permitiu fazer a ligação entre uma das estirpes e todas as variantes que afectam os humanos. Apesar das muitas semelhanças genéticas detectadas entre o plasmaodium falciparum (responsável por cerca de 85 por cento dos casos nos humanos e por quase todas as mortes) e o plasmodium reichenowi (detectado em oito dos chimpanzés) foram identificadas algumas diferenças. A espécie que afecta os chimpanzés tem um gene (CMAH) desactivado, enquanto a outra apresenta uma sobre expressão do mesmo gene. Porém, é o território genético comum que faz com que os cientistas defendam que este “salto” ocorreu recentemente – algo entre há cinco mil anos e há dois milhões de anos.
“Estamos a tentar perceber melhor quando a transferência do chimpanzé para o humano ocorreu. Os nossos resultados mostram que aconteceu apenas uma vez. Já mostrámos que a expansão mundial da malária ocorreu de forma muito rápida, tendo começado há cerca de cinco mil anos, a partir da Africa tropical. Queremos perceber quanto tempo antes terá acontecido a transmissão entre o chimpanzé e o humano”, adiantou Francisco Ayala.
“Ao mostrar que o Plasmodium falciparum interage com humanos há relativamente pouco tempo, explica porque é que este parasita é ainda tão virulento e letal para os seres humanos”, comenta Maria Mota, responsável da Unidade de Malária do Instituto de Medicina Molecular (IMM), em Lisboa, considerando este trabalho “muito interessante”. Céline Carret, bioinformática da mesma unidade de investigação que trabalha nesta área há vários anos, destaca ainda o facto de ser “particularmente curioso os resultados sugerirem que apenas um hospedeiro chimpanzé transferiu para um humano o parasita que viria a ser o que é agora o P. falciparum”.
“Um simples evento biológico tem um impacto enorme na estrutura da população humana e no nosso planeta. O facto de esta passagem não ter ocorrido mais vezes parece ser devido à especificidade que o parasita tem para as moléculas na superfície das nossas células que precisa invadir para sobreviver. O mais interessante é que este tipo de moléculas (ácido siálico) está na base da restrição que existe também da transmissão da gripe das aves para seres humanos. A biologia duma mesma molécula parece estar na base da transmissão de diferentes doenças infecciosas”, concluem as investigadoras do IMM.

Andrea Cunha Freitas/Público – 05.08.2009

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